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de Cidadão na voz de Silvio Brito.


Cidadão

Tá vendo aquele edifício moço?
Ajudei a levantar...
Foi um tempo de aflição,
Eram quatro condução,
Duas pra ir, duas pra voltar...
Hoje depois dele pronto,
olho pra cima e fico tonto...
Mas me chega um cidadão,
e me diz desconfiado:
tu tá aí admirado
ou tá querendo roubar?

Meu domingo tá perdido,
vou pra casa entristecido...
Dá vontade de beber.
E pra aumentar o meu tédio,
eu nem posso olhar pro prédio,
que eu ajudei a fazer...

Tá vendo aquele colégio moço?
Eu também trabalhei lá...
Lá eu quase me arrebento,
Pus a massa fiz cimento,
Ajudei a rebocar...
Minha filha inocente,
vem pra mim toda contente.
Pai vou me matricular...
Mas me diz um cidadão:
Criança de pé no chão,
aqui não pode estudar.

Esta dor doeu mais forte...
por que que eu deixei o norte,
eu me pus a me dizer...
Lá a seca castigava...
mas o pouco que eu plantava,
tinha direito a comer.

Tá vendo aquela igreja moço?
Onde o padre diz amém...
Pus o sino e o badalo.
Enchi minha mão de calo...
Lá eu trabalhei também.
Lá sim valeu a pena...
Tem quermesse, tem novena
e o padre me deixa entrar.

Foi lá que Cristo me disse:
Rapaz deixe de tolice,
não se deixe amedrontar.

Fui eu quem criou a terra,
enchi o rio, fiz a serra...
Não deixei nada faltar.

Hoje o homem criou asas...
e na maioria das casas,
Eu também não posso entrar...

(Lucio Barbosa)
 

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